PROGREÇÕES DE ACORDES

PROGREÇÕES DE ACORDES
Esta lição requer uma boa dose de capacidade de "sentir" os sons. É a partir deste ponto que musica deixa de ser um conjunto de regras lógicas e assume seu caráter mais "artístico". Vamos lá. Toque um acorde maior qualquer, o de G, por exemplo. Ouviu? Sentiu? Agora toque um Gm. Ouviu a diferença? Sentiu a diferença? A maioria dos autores, quando tenta expressar com palavras esta diferença, costuma descrever o som dos acordes maiores como alegres, para cima, "up" e outros adjetivos similares, enquanto os acordes menores são descritos com sendo exatamente ao contrário, ou seja, tristes, para baixo, "down". Assim, músicas com motivos tristes, de "fossa", etc, tendem a ser construidas em tons menores, ao contrário das musicas alegres, que exprimem felicidade. Este tipo de sentimento que é normalmente gerado por diferentes acordes é também utilizado na construção de padrões sequênciais pré-definidos, ou seja, que contem sequências de acordes, denominadas progressões.
À prática. Pegue uma sequência de acordes qualquer numa canção, uma como C F G C. Isto é uma progressão de acordes. Entendeu? Agora ao que realmente interessa. Pegue uma guitarra e toque esta progressão. Repita a seqüência várias vezes experimentando diferentes ritmos e batidas. Parece que todos os acorde se encaixam perfeitamente? Soa familiar? Pois bem, devia. Você deveria ser também capaz de perceber (sentir?) que quando chega ao G ele parece estar pedindo que uma outra nota seja tocada logo em seguida. Este "apelo" é comumente denominado de tensão. Ou seja, certas notas conduzem à um crescendo, à um acúmulo de tensão. Quando você volta ao C esta tensão é liberada. Da próxima vez que ouvir uma boa musica (clássica ou popular) tente perceber a tensão se acumulando em determinados trechos, até atingir um clímax (com certa freqüência a parte mais alta), para ser em seguida liberada. Esta progressão, que é uma das mais comuns nos dias atuais, é denominada de progressão I IV V, e tem justamente estas características, quais sejam, acúmulo de tensão e posterior liberação.
É capaz de adivinhar porque ela é denominada de I IV V? ... porque é composta dos acordes de número I, IV e V de uma escala musical, neste caso a de C. Veja abaixo:
escala maior
C     Dm      Em     F     G      A m    B dim     C
I      IIm      IIIm    IV     V      VIm    VII dim    VIII
Escala menor
Im      II dim    III bem    IVm     V      VI bem   VII bem   VIII m
Cm     D dim   E bem   Fm      G      A bem     B bem
Na escala de D, por exemplo, ela teria a seguinte formação: D G A D. Volte à lição II e confira. Monte esta mesma progressão para as diferentes escalas.
Uma outra progressão bastante comum é a I III IV. Que na escala de C resultaria em C E F. E na escala de E? Isto mesmo, E G# A. Experimente com esta progressão em diferentes escalas e com diferentes batidas..
Nos vamos voltar às progressões quando falarmos de blues. Há, entretanto, duas coisas que deve lembrar neste momento: (1) um grande número de canções baseia-se em progressões típicas e relativamente fáceis de serem aprendidas e (2) as progressões constituem-se apenas numa base que permite inúmeras variações, e não em regras fixas. Aliás, os grandes músicos são justamente aqueles que de certa forma desrespeitam estas progressões sem, entretanto, quebrar a harmonia do conjunto musical. Em outras palavras, a tensão é acumulada e quebrada através de uma progressão não convencional de acordes (o termo criatividade em toda sua extensão).
BLUES
Um Pouco de História
Muito se tem escrito e falado sobre a origem do Blues que, evidentemente, permanecerá incerta para sempre. Não obstante é possível traçar algumas de suas mais significativas influências, quais sejam, os cantos de trabalho e os "hollers" (lamentos).
Os cantos de trabalhos eram tipicamente utilizados por negros trabalhando em grupos no sul dos Estados Unidos, particularmente no Mississipi e Louisiana. Um solista cantava frases curtas que eram então repetidas pelo conjunto dos demais trabalhadores. Estas frases eram emitidas de forma mais ou menos lenta e ritmada, na verdade no ritmo em que se desenvolvia o trabalho. Você provavelmente já deve ter visto isso em algum filme (especialmente aqueles que apresentam um grupo de presos trabalhando na beira de alguma estrada do Mississipi).
Os "hollers", por outro lado, eram produzidos por indivíduos normalmente sozinhos e, por isto, os cantos eram bem mais altos. As atuais canções que se ouve nas igrejas negras protestantes do Estados Unidos ("spirituals") são claramente inspiradas neste estilo.
Na musica africana, aonde evidentemente encontram-se as raízes do Blues, a escala musical é pentatônica, ou seja, constituída por apenas 5 notas musicais. Escalas pentatônicas são ainda hoje, principalmente devido a sua relativa simplicidade, utilizadas por musicos dos mais diversos, inclusive no estilo Blues. Veremos este tipo de escala com mais detalhes na lição XI.
Quando se interpretavam as canções de trabalho, ou os "hollers", sem acompanhamento instrumental, como deve ter acontecido no principio quando os negros as cantavam no campo, a diferença entre a escala africana (pentatônica) e a escala européia, que contem 7 notas musicais (a chamada escala diatônica, que poderia ser também denominada heptatônica), não trazia consigo qualquer problema. Entretanto, quando se tentava acompanhar estas mesmas canções com instrumentos musicais europeus, construídos para a escala diatônica, o conflito era inevitavel. Tal conflito gerou o que hoje se conhece por blue notes, que são consideradas uma tentativa dos músicos afro-americanos de tocar exatamente aquilo que cantavam. Estas blue notes são normalmente a III e a VII da escala, que são tocadas com aumento ou descida de meio tom (veremos isto também na lição XI).
Outro aspecto interessante é a de que no Blues normalmente não se encontram canções inteiramente no modo menor. Veremos uma das progressões de acordes mais típicas do Blues na lição X. Não obstante, os solos podem ser amiúde realizados numa escala menor, o que contribui para dar à este estilo musical uma conotação dúbia ou incerta. Uma conotação Blues, diriam os mais puristas.
Evidentemente não pretendemos escrever um guia completo sobre Blues, nem mesmo um guia. Nossa intenção é de apenas introduzir as bases teóricas deste estilo, para que se possa, se não toca-lo, pelo menos ouvi-lo de forma mais crítica e apurada.

Progressão de 12 compasso blues

 

Escala do blues

Progressão Blues de 12 Compassos

Lembra-se do que já vimos sobre progressão de acordes? Pois bem, vamos agora aplica-la ao Blues. Todo guitarrista interessado em Blues (na verdade também em rock) deve conhecer a progressão Blues de 12 compassos (de "cór" e salteado). Deve ser capaz de toca-la de olhos fechados, de trás para frente, etc.
Antes de passar à progressão propriamente dita acho que vale a pena lembrar a definição de compasso, qual seja, a de unidade métrica de tempo. Explico, muito embora seja meio complicado botar em palavras. Quando ouve uma musica qualquer deve perceber que há sempre uma batida rítmica (regular) de fundo. Cada uma destas batidas corresponde normalmente a um compasso (ou uma subdivisão deste). Ouça uma musica qualquer. Percebe? É como o tic-tac de um relógio. Se não consegue perceber isto sozinho então temos um problema, pois não é possível explicar muito bem com palavras. O ideal seria procurar alguém que tenha algum conhecimento musical e pedir que ele(a) lhe mostre (na prática) o que um compasso significa. De qualquer forma, se ainda não conseguiu, é possível que você perceba isto tocando a progressão de Blues que veremos a seguir.
Na sua forma mais elementar esta progressão constitue-se de 3 linhas de quatro compassos cada. Em cada compasso toca-se um acorde, que vai sofrendo pequenas modificações em cada uma delas. Assim:




I / / /
I / / /
I / / /
I / / /
IV / / /
IV / / /
I / / /
I / / /
V7 / / /
V7 / / /
I / / /
I / / /
I = tônica (pode escolher o acorde correspondente ao tom que mais lhe agradar). Sugiro começar por algo como A ou E.
IV = quarto grau (também conhecido como subdominante)
V = quinto grau ou dominante sétima.
Experimente tocar este padrão fazendo com que cada compasso contenha 4 batidas. Pode bater com o pé mesmo. Bata ritmicamente, na velocidade que mais lhe aprouver, e a cada 4 batidas toque o acorde estabelecido. O momento de troca do acorde corresponde a primeira batida do compasso. Tente!
Para cada um dos diferentes tons maiores, por exemplo, pode-se usar os seguintes acordes:
I = C     IV = F      V 7 = G7
I = D     IV = G      V7 = A7
I = E     IV = A      V7 = B7
I = F     IV = B      V7 = C7
I = G     IV = C      V7 = D7
I = A     IV = D      V7 = E7
I = B     IV = E      V7 = F#7
Procure ouvir com atenção as relações entre os acordes. Particularmente entre a tônica e dominante 7. Procure perceber como a tensão cresce a medida em que se toca a dominante 7. Tensão esta que é aliviada quando se retorna à tônica. É como se esta última fosse chamada pela dominante 7. Esta relação entre tônica e a dominante 7 é muito importante na musica, não apenas no Blues. Faz na verdade parte de progressões comuns no rock, country, etc. Procure tentar identifica-la quando ouvir musica.
Observe que na seqüência de 12 compassos que vimos acima a tensão gerada pela dominante 7 nos compassos 9 e 10 foi aliviada retornando-se à tônica nos compassos 11 e 12. O que aconteceria então se substituir-mos o compasso 12 também pela dominante 7? Assim:




I / / /
I / / /
I / / /
I / / /
IV / / /
IV / / /
I / / /
I / / /
V7 / / /
V7 / / /
I / / /
V7 / / /

Neste caso obtém um acorde que conduz outra vez para a tônica, ou seja, para um reinicio do fraseado. Utilize esta substituição quando for repetir a progressão. Entretanto, não deve terminar uma musica com uma dominante 7. Soa como um caso mal resolvido. Portanto, da última vez que você tocar a progressão, substitua outra vez no último compasso a V7 pela I.
Esta progressão pode soar ainda melhor se você um pouco a dominante 7 no último compasso, ou seja, segurar a tônica durante uma batida a mais no compasso de número 12. Veja abaixo:



I / / /
I / / /
I / / /
I / / /
IV / / /
IV / / /
I / / /
I / / /
V7 / / /
V7 / / /
I / / /
/ V7 / /
Experimente. Só tocando perceberá a diferença.
Outra modificação interessante consiste em substituir a dominante 7 do 10o compasso pela subdominante, tornando tudo um pouco mais "light". Dessa forma:




I / / /
I / / /
I / / /
I / / /
IV / / /
IV / / /
I / / /
I / / /
V7 / / /
IV / / /
I / / /
/ V7 / /
Experimente outra vez. Achou melhor? Não? Tudo bem, qualquer uma das duas progressões esta perfeita e, acho que deve concordar comigo, soa muito bem.
Outra modificação interessante consiste em fazer com que as três últimas batidas do 4o compasso contenham uma tônica com sétima (I7), dessa forma:




I / / /
I / / /
I / / /
I I7 / /
IV / / /
IV / / /
I / / /
I / / /
V7 / / /
IV / / /
I / / /
/ V7 / /
Toque e ouça o resultado. Do meu ponto de vista soa melhor, cria uma nova tensão no meio do fraseado, que é aliviada pela subdominante. Na verdade, se voltar e der uma espiadela na relação de tônicas, subdominantes e dominantes no inicio desta lição perceberá que toda tônica é, ao mesmo tempo, a dominante 7 do acorde de IV grau, de tal forma que o que fizemos foi introduzir mais uma relação tônica/dominante 7.
Quando a progressão Blues de 12 compassos é tocada, normalmente a subdominante dos compassos 5, 6 e 10 é substituída pela subdominante 7, da seguinte forma:




I / / /
I / / /
I / / /
I I7 / /
IV7 / / /
IV7 / / /
I / / /
I / / /
V7 / / /
IV7 / / /
I / / /
/ V7 / /
Se você estivesse tocando esta progressão em A, por exemplo, teria os seguintes acordes:




A / / /
A / / /
A / / /
A A7 / /
D7 / / /
D7 / / /
A / / /
A / / /
E7 / / /
D7 / / /
A / / /
/ E7 / /
Toque e ouça o efeito de cada acorde. Evidentemente esta não é a única progressão utilizada no Blues mas é, sem dúvida alguma, a mais clássica e, por isto, acredito que deva servir como bom ponto de partida.
Frequentemente no Blues todos acordes que compõem a progressão são tocados como sétimas. Experimente. Na verdade esta é a chave: experimente.

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